A magia entre o som e o silêncio

Adriana Costa
3 min readFeb 15, 2023

“Para aprender a compreender, o curandeiro Songhay deve aprender a ouvir o som dos termos como um músico aprende a reconhecer os da música. Assim como o som é a figura central do mundo da música, ele o é igualmente para o mundo da magia. Este universo de som é uma rede de forças “

Os curandeiros da Nigéria entendem que os sons são carregados de força e sua energia vibratória pode curar ou adoecer uma pessoa. para a cultura popular hindu, um mantra é também uma fórmula sonora, um ritmo que desperta acontecimentos e propicia ações no mundo.

Resolvi iniciar a conversa com estes sons sagrados, trazidos na escrita terceiro capítulo do livro de David Le Breton : Antropologia dos sentidos.

A maneira como uma palavra é falada, entoada ou cantada revela sua força, vibração e intenção. O som na espiritualidade é um caminho e o silêncio interior é o que permite a escuta : ouvir-se e ouvir o outro.

Estamos imersos na sonoridade, este sentido jamais se apaga , ele pode ser fraco ou intenso, presente ou distante, harmonioso ou cacofônico, a questão é que ele penetra nossa vida e não temos com este sentido a mesma maleabilidade do tato ou da visão. As emanações sonoras jamais se apagam, estamos embrenhados em sua trama.

“ Cada comunidade humana ocupa um universo acústico próprio, jamais dado de uma vez por todas, variando ao longo da história , e até mesmo ao longo das estações”

Hoje cada pessoa pode alimentar sua bolha sonora, o que considera barulho ou harmonia. O que perturba uma pessoa pode não perturbar outra, temos percepções e sensibilidades sonoras diversas. Esta bolha é hoje representada pelos fones de ouvido, que geram acústicas próprias e revelam formas de pertença e afastamento social.

O que este controle sonoro produz nas relações ?

Esta curadoria do que pode ou não ser ouvido gera hipersensibilidades, quando saímos desta proteção acústica nos sentimos mais expostos. É muito interessante a discussão no livro da prática do charivari.

“O charivari sonoro é uma tentativa simbólica de anulação da desordem, seja ela social ou cósmica. Ele visa afastar as ameaças anunciadas pela ruptura das familiaridades”

Percebemos que o som é uma fronteira, um limiar sensível. As tentativas de aplacar sua presença desordeira, criando estratégias de isolamento acabam por agravar nossas dissonâncias íntimas e sociais.

Cuidar da harmonia e ressonância desta ambiência sonora é fundamental, penso que vai além das leis do PSIU! e requer uma escuta amorosa das nossas diferenças existenciais. Ou como diz o poema de Alberto Caeiro :

“Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito; é preciso também que haja silêncio dentro da alma”

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Adriana Costa

Apaixonada por plantas, música, literatura, educação e processos criativos. https://www.residenciacriativa.com/